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Além da Saudade: Como o Mundo Celebra a Vida no Dia dos Finados.

 
Por Nonato Torres

Há uma certa magia no ar quando o calendário marca o dia 2 de novembro. Aqui no Brasil, é um dia silencioso. O coração fica pesado, o céu costuma ficar cinza, e nós nos recolhemos. É o Dia de Finados. Um dia de levar flores aos cemitérios, de acender velas, de lembrar com uma dorzinha no peito aqueles que se foram.

É um dia de saudade. Pura e simples.

Mas, enquanto aqui a tonalidade é de reflexão tranquila e respeito, eu fico pensando na incrível diversidade com que o mundo encara este mesmo dia. E a maior lição que levo é que, em muitos lugares, este não é um dia para chorar os que partiram, mas para celebrar a vida que eles viveram.

México: A Festa que Ilumina a Morte

Se tem um lugar que entendeu como transformar a saudade em alegria é o México. O Día de los Muertos não é um dia, mas uma festa de dias 1 e 2 de novembro que é pura explosão de cor, sabor e vida.

Imagine só: não há tristeza nos cemitérios, há festa! As famílias fazem piqueniques ao lado dos túmulos, comem a comida preferida dos seus entes queridos, contam histórias engraçadas e riem à vontade. Os altares (as ofrendas) são uma maravilha para os olhos: cheios de cempasúchil (os cravos-de-defunto laranjas), caveiras de açúcar coloridas, papel picado e a foto da pessoa homenageada.

A crença é linda: nesses dias, as almas dos falecidos recebem permissão para voltar ao mundo dos vivos para visitar os seus familiares. E que visita seria se os recebessem com lágrimas? Eles querem é sentir o cheiro da sua comida favorita, ouvir as suas músicas e ver os sorrisos nos rostos de quem amam. É uma filosofia de vida: a morte é parte do ciclo, e a melhor homenagem é a alegria.

E a Nossa América do Sul? Turismo e Tradição

Na Argentina, o Día de los Difuntos é parecido com o nosso, um feriado de recolhimento. Mas a cidade de Capilla del Señor, na província de Buenos Aires, transformou essa data em algo único. Lá, organizam o "Tren de los Difuntos", um trem temático que leva turistas e locais até a cidade para uma noite de visitas aos cemitérios, com histórias, música e reflexão. É uma forma de unir turismo com cultura e espiritualidade, mostrando que até na tristeza pode haver beleza e conexão.

Do Outro Lado do Atlântico: As Velas e as Castanhas

Em Portugal, o dia é muito semelhante ao nosso. É o Dia de Finados, um feriado solene. As pessoas vão aos cemitérios, limpam os túmulos, levam crisântemos e acendem velas. O silêncio é quebrado apenas pelo sussurro de preces. É um dia de família, de estar junto para lembrar.

Já na Espanha, as tradições variam. Em regiões como a Galiza, há o costume de ir aos cemitérios e, nessa época, é comum ver pessoas a vender huesos de santo (doces de amêndoa com forma de ossos) e buñuelos. É uma data importante, mas que em alguns lugares começa a ser influenciada pela vibrante celebração mexicana.

Na Itália, o Giorno dei Morti (Dia dos Mortos) é, curiosamente, uma data um pouco mais doce. Especialmente na Sicília, a tradição diz que os mortos trazem presentes e doces para as crianças bem-comportadas. O doce típico são os dolci dei morti, biscoitos em forma de osso, e a frutta di Martorana, marzipãs com forma de fruta. É um dia de memória, mas com um toque de doçura e esperança.

A Sabedoria Ancestral: Os Povos Indígenas

E não podemos esquecer das raízes mais profundas desta terra. Para muitos povos indígenas brasileiros, a relação com a morte e os antepassados é completamente diferente da visão ocidental. A morte não é um fim, mas uma transição. Os espíritos dos ancestiais continuam presentes, vivos na natureza, nas histórias, nos rituais.

Eles não separam os "vivos" dos "mortos" de forma tão rígida. A vida é um ciclo contínuo. A memória é mantida viva através dos rituais, das danças, das pinturas corporais e da oralidade. Honrar os que se foram é manter as suas tradições, é falar os seus nomes, é viver em harmonia com a terra que eles habitaram. É uma conexão eterna e espiritual.

E No Meu Coração?

No fim das contas, percebo que não existe uma maneira certa ou errada de viver este dia. Seja com a quietude e o respeito que sentimos aqui no Brasil, com a festa explosiva do México, com os doces da Itália ou com a conexão espiritual dos povos originários, o que importa é o sentimento universal por trás de tudo.

O Dia de Finados, em qualquer canto do mundo, é sobre amor.

É a prova de que o amor é mais forte do que a morte. É o nosso jeito de dizer: "Você foi importante. Sua vida fez diferença. E você nunca, nunca será esquecido".

E talvez, no fundo, seja isso que nos une, de norte a sul, do oriente ao ocidente. A certeza de que celebrar uma vida é a maior homenagem que podemos prestar.

E você, como vive este dia? Conhece alguma outra tradição? Partilha aqui nos comentários.

Um abraço apertado e que a nossa memória seja sempre um lugar de paz e luz.



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